Preparo Protético para Coroa Total

Olá pessoal, espero que tenham gostado do artigo sobre retentores intrarradiculares, se não leu ou ainda não fez suas considerações vá lá e dê sua contribuição!!! Por que eu lhes convido à leitura sobre retentores intrarradiculares? Exatamente porque após a cimentação de retentores intrarradiculares, em vias de regra, partimos para preparos de coroa total. Tema que abordaremos nesse artigo. Sem esquecer do lema:

 

“Eu, Sandro Bon, não pretendo que meus caros leitores apenas reproduzam as técnicas ou dicas aqui abordadas; mas, fundamentalmente, que façam uma análise crítica sobre o assunto para que possamos debater e evoluirmos juntos”.

 

Gostaria de começar com uma afirmação:

 

“Preparos protéticos bem definidos facilitam a confecção das restaurações provisórias, da moldagem/escaneamento, dos modelos analógicos ou digitais, da precisão laboratorial e, consequentemente, de trabalhos previsíveis a longo prazo.”

 

Com o surgimento da odontologia adesiva, muitos colegas passaram a negligenciar princípios básicos de biomecânica, delegando o sucesso única e exclusivamente a adesão químico-mecânica conseguida através da camada híbrida e dos cimentos resinosos. Acontece, que nem sempre as condições dos tecidos dentários são favoráveis a uma perfeita adesão, em especial, quando falamos em preparos protéticos para coroa total, corriqueiramente, não contamos com a presença de nenhum ou pouco remanescente de esmalte e, sabemos que a formação de uma camada híbrida sobre dentina não promove a mesma força de união se comparada ao esmalte, agravada ainda por algumas situações clínicas que podem complicar ainda mais o processo, tais como: dentina reacional, presença de núcleo metálico fundido (NMF), materiais restauradores de natureza não adesiva (metalocerâmica ou zircônia, por exemplo); em que negligenciar os princípios biomecânicos pode ser o motivo do insucesso.

 

A seguir, vamos discriminar 3 princípios básicos que norteiam os preparos protéticos.

 

1 – BIOLÓGICOS

 

1.1 – PULPARES

Antes de selecionar a broca A, B ou C; sua forma ou granulação, eu preciso saber se o dente que vou preparar é vital ou não, visto que esse simples detalhe já vai nos nortear quanto aos cuidados que deveremos ter para proteger o complexo dentino-pulpar ou não. Na minha vida acadêmica, não raro, me deparo com alunos anestesiando paciente com NMF ou pinos de fibra de vidro (PFV), além de promover um verdadeiro banho coletivo de tanta irrigação utilizada sem necessidade.

Sabe por que isso acontece? Simplesmente por falta de atenção, preguiça de verificar a radiografia ou de parar e refletir um pouquinho sobre o procedimento operatório!!!

Muitas vezes já cheguei perto e falei: “cuidado para não fritar a polpa do paciente!”. A reação é sempre surpreendente, por isso continuarei alertando da mesma forma… kkkk.

 

1.2 – PERIODONTAIS
É fato que a linha de terminação do preparo deve estar bem definida e respeitando o espaço biológico periodontal (EBP). Uma sugestão da literatura é nunca colocar a linha de terminação mais que 0,5mm intrassulcular. Certamente há uma pequena variação de acordo com o fenótipo gengival, entretanto, onde o fenótipo gengival é delgado, Tipo IV – segundo classificação de Maynard e Wilson, é onde precisamos ter maior cuidado para não invadirmos o EBP. Fator agravante é termos o dente em região estética e com a raiz escurecida por oxidação de NMF confeccionado com liga de metal não nobre, por exemplo. É crucial observar esse detalhe no planejamento inicial e na fase de restauração provisória, podendo apontar para necessidade de enxertia de tecido mole para ganhar em volume e “mascarar” o efeito anti-estético.

 

2 – MECÂNICOS

 

2.1 – RETENÇÃO

Segundo Schillimburg, retenção pode ser definida como “a resistência ao deslocamento da restauração em um único eixo”. Portanto, a retenção de uma CT está diretamente relacionada à capacidade desta se manter assentada sobre o dente perante as forças que atuam sobre a mesma, em especial, a força de tensão ou tração.

Essa capacidade está diretamente relacionada às inclinações das paredes axiais conferidas ao preparo, a altura das paredes x largura que, por sua vez, influenciam diretamente na estabilidade da CT sob forças oblíquas. Outro fator importante é a adaptação da restauração sobre o preparo, gerando uma fina película de cimento, a qual aumentará o poder friccional e, associado a tudo isso, o tipo de cimento utilizado. Posso afirmar para vocês, que as CT de zircônia tem um espaço interno, planejado de acordo com o software CAD-CAM, maior que as CTMC e, por consequência, maior linha de cimentação e menor embricamento mecânico.

 

2.2 – ESTABILIDADE

Vale ressaltar que dentes com pouca altura – por exemplo, os segundos molares – e com maior largura que os outros dentes tendem a ter uma condição menos estável sob forças oblíquas e, nessas situações, vale pensarmos em meios para compensar essa falta de estabilidade. Podemos lançar mão de caixas ou canaletas para restaurações não adesivas; Coroa Total Metalo-Cerâmica (CTMC) – por exemplo. Sugiro 2 canaletas em faces perpendiculares (exemplo, Vestibular e Mesial) com atenção para o paralelismo ao eixo de inserção. Parâmetros para escolha das paredes a receber as canaletas: parede com maior altura, dente natural ao invés de material de preenchimento e facilidade de visualização.

 

Outra alternativa é lançar mão de uma cerâmica condicionável, IPS e.max – Ivoclar® – por exemplo, e se utilizar de uma cimentação adesiva com a utilização de um cimento resinoso de presa dual. Entretanto, segundo vários autores (Jorgerson, Schillimburg, Pegoraro, Mezzomo, Périklis, Rosenstiel, etc) a melhor retenção se faz quando temos uma convergência entre as paredes axiais variando de 6º a 10º, podendo ser tolerável, clinicamente, até 20º (10 de cada lado) desde que se tenha maior altura de paredes axiais.

Portanto, verificamos que a retenção está diretamente relacionada a estabilidade da coroa total sobre o preparo protético.

 

2.3 – RESISTÊNCIA

A resistência da CT está diretamente relacionada às propriedades mecânicas do material restaurador, da cimentação, do substrato e da espessura adequada deixada pelo preparo para restaurações sem metal (Metal Free), em especial.

 

Sulcos ou canaletas de orientação para o desgaste podem funcionar perfeitamente, desde que o dente esteja bem posicionado tridimensionalmente no arco. Entretanto, eu prefiro me orientar pela anatomia final desejada da CT. A restauração provisória é um excelente artifício para verificação das condições adequadas do preparo protético. Os profissionais mais experientes conseguem visualizar com mais facilidade os detalhes; porém, aos colegas menos experientes, sugiro a utilização de guias de desgastes em silicone ou acetato que podem ser obtidas a partir de enceramento diagnóstico prévio. A tecnologia digital dos scaners intra-orais podem facilitar a visualização, mas ainda não é uma ferramenta acessível a muitos dentistas. Fotografias digitais e magnificação através de lupas ou microscópios também são muito bem-vindos para um excelente refinamento dos preparos. Eu diria que pelo menos uma lupa de pala é fundamental.

 

3 – ESTÉTICOS
O 3º e último requisito aqui abordado pode influenciar a forma do preparo, especialmente quando o substrato é inadequado à estética natural, apresentando-se escurecido ou metálico e, nessa situação, espessura adequada e atenção especial a linha de terminação deve ser dada quando trabalhamos com CT metal free condicionáveis, porque sua matriz vítrea lhe confere uma condição ótica mais translúcida. Querendo tornar o caso mais crítico basta adicionar a isso um fenótipo gengival fino, como já citado nos requisitos biológicos. Existem sistemas com pastilhas de diferentes opacidades para fresagem ou injeção cerâmica em CAD-CAM. O mapeamento através de fotografias nesses casos facilitam muito a tomada de decisão por parte do Técnico em Prótese Dentária (TPD), o qual, poderá optar por pastilhas mais opacas ou até mesmo sugerir utilizar zircônia, a qual, apesar de não condicionável, possui uma capacidade muito maior de mascaramento, especialmente, onde há pouca espessura cervical. Quando há uma espessura adequada (>1,5mm), um bom TPD consegue resultados estéticos espetaculares até mesmo com CTMC.

 

Ainda falando sobre espaço adequado para a anatomia ideal da CT, lembrem-se que as cúspides funcionais tendem a ter uma inclinação maior em direção ao sulco principal do que as cúspides de não trabalho que tendem a ser mais verticais. Atenção especial a esse detalhe, fazendo um contra bisel, pode ser crucial para evitar uma fina espessura da restauração em área funcional ou até mesmo um sobrecontorno feito pelo laboratório que promoverá uma interferência oclusal e, que após ajuste, levará a condição descrita anteriormente, causando maior fragilidade ou até mesmo um efeito anti-estético, se o substrato for escurecido ou se estiver utilizando um casquete metálico. Essa condição de falta de desgaste adequada do preparo se vê muito também em área de cíngulo, que por sua vez levará aos mesmos problemas já mencionados.

 

Acrescido dessas orientações podemos dizer que uma linha de terminação em chanfro longo, em área estética, facilita o escoamento do cimento e melhor assentamento da CT, caso o substrato seja favorável. Por outro lado, um chanfro profundo deve ser escolhido para dar maior espessura de material restaurador. A transição entre paredes sempre deve ser arredondada para facilitar o assentamento da peça protética, melhorar o escoamento do cimento e evitar área de concentração de estresse, quando em função, sob as restaurações metal free, evitando possíveis fraturas.

 

Concluindo nosso artigo, deixo uma questão: qual a parede deve ser a última a ser preparada?

Aguardo os comentários no Insta do CEO Group.

Forte abraço!!!

 

Sandro Bon
Prof. Coordenador curso CCOI – CBMERJ
Especialista em Prótese Dentária – UERJ
Atualização em Implantodontia – SI
Mestre em Clínica Odontológica – UFF
E-mail: sandrobon73@gmail.com
Instagram: @sandro.bon